quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Registro Musical

Vejam esta beleza escrita pelo jornalista Chico Pop, ja falecido, para o projeto "Registro Musical".

chico

AS TRIBOS URBANAS

Chico Pop - É Jornalista e Apaixonado por música.

O Sentido das coisas cada um dá. A ordem se é que há. Se você fala de arte para uma criança, ela imediatamente é capaz de dizer que gosta de música. Claro, a música é a mais totalitária das artes. A “música divina” flui, naturalmente, em todas as cabeças pensantes do planeta terra. E já que me refiro a música do planeta terra, porque não a nossa ? Mas existe a musica diferenciada ? Talvez (quem sabe) um acorde dissonante.

Então, não existe nada mais baixo e irritante, que a pergunta invariável e até geral - no caso a min, não especialista em música - mas um “louco por música”.

E é ai que me faço a pergunta:

- Existe música ? Ela existe no Acre. Sei não, sei sim, como explicar, se nem ao menos sei tocar um instrumento ?

Mas me referindo à música Acreana, Nativa, será que ela existe ? E eu lá sei ? Lá alguém sabe ? E pode alguém responder à essa pergunta ?

Pelo visto, pelo que se comenta, ainda não se pode dizer que exista uma música Nativa, enraizada, especificada.

Então é isso: A nossa música é “A Música, Humana Música”, “flui”, naturalmente, sem fronteiras, sem rótulos, mas “flui” em todos os sentidos. E por que não ?

Mas o estigma permanece, as pessoas querem outras vezes saber do que se supõe “estar por dentro ?”.

O que deve achar da música acreana um “especialista”, diante dessas interrogações. E sempre será (ou quase) sempre assim. E lá se pode falar nos fatores que a determinam, de uma outra forma que ela interfere na vida das pessoas, as que produzem, divulgam e que consomem música por aqui. Se é que o artista acreano vende discos. O que interessa mesmo é o humano, é a aventura do músico, e do letrista, compositor, interprete da terra, que enquanto a vida corre e o espírito desses artistas, desses valores populares, lutam para o engrandecer musicalmente.

Por que não perguntar como vai o homem ou mulher que faz ou ouve música no Acre ? Por que não perguntar que importância tem os muitos e muitos músicos e interpretes diante dos senhores, de adentrar no mercado fonográfico brasileiro, de saber que sua música esta sendo tocada, executada, no rádio ou na TV.

Aos que perguntam como vai a música acreana ? “Aos que perguntam se ela existe ?” Sugiro uma urgente navegada por mares outros que não os da música. E talvez assim possam descobrir, por si mesmos, como ela vai. E talvez descobrir o que se pode fazer pela música nativa. Essa é a busca: Música, música e música, sem a qual de nada interessa saber a “via crucis” dos jovens músicos, compositores e interpretes, certamente não será apenas no nosso Acre. No Brasil em quase todas as regiões, os jovens músicos, interpretes, poetas e compositores se encontram diante de dificuldades, quando tentam divulgar e mostrar um trabalho musical. Quase sempre as portas das gravadoras, dos estúdios, da mídia em geral, estão sempre fechadas. Então quem asfixia ? E o que acontece ao calar a boca de um vulcão ? Desses que exala um vapor continuo. Um grito, um clamor que o tempo todo escapa entre o que se deseja e o que se vive. Talvez só seja possível entender o uso de nossa música assim, perguntando da sua força, e da força da demanda que a sustenta, se é que ela existe ? Se ela existe, logo não se cala. Por outro lado há a perspectiva daqueles que, já que ela não se cala, e já que é forte, que pelo menos fale a verdade e diga a que vem. E isso parece que tende a acontecer, mas se nem sempre é possível o desejo dessa força, decididamente, ela esta em algum lugar. Entre os festivais Fampistas ou em vários bares da cidade “ao vivo e em cores”, onde ainda prevalece algum toque.

Muitos falam que os festivais de música já realizados no Acre pecaram, quase sempre, por esquecer que música se faz com empenho, arte e sensibilidade, e somente alguns perceberam isso. Somente alguns depois dos FAMPs, continuaram na busca, na força, na tarefa árdua e enervante, de compor, de dar continuidade ao seu trabalho musical.

Como se vê, o nosso saldo festivalesco parece um pouco negativo. Não obstante, dentro desse quadro convencional que sempre o caracterizou, alguns se destacando e gerando frutos (doces ou amargos). Convém ressaltar que os nomes mais fortes lançados além das fronteiras estaduais, como João Donato, Nazaré Pereira, Sérgio Souto e Mário Brasil, não se projetaram por meio de festivais de Música.

Mas, afinal, o que é a música acreana ? A pedra Aquiry já rolou ? Sim ou não ? Ou será talvez ? E muitos continuam como pedras a rolar. Parece até papo de Boliviano. Mas como já dizia Caetano Veloso “Como é bom tocar um instrumento” ou “Eu sigo apenas porque gosto de cantar”. E é como esse desabafo, em efeitos sonoros dos Hinários do Mestre Irineu Serra e de Padrinho Sebastião. E é como nos acordes dissonantes daquela canção na espera da era de aquário.

É tudo, e mais alguma coisa. “É música, Divina Música”. Que não é um privilegio dos Deuses, mas uma brisa a empurrar a caravela da aventura humana.

mulher

A Musa - Ilustração de Danilo de S'Acre para o projeto Registro Musical.

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