Assisti calado ao espancamento. Eu estava distante.
Vendo, pela televisão, ao linchamento de um “inocente”. E quase me vi no lugar dele. Sem chance de defesa, os olhares que julgavam enquanto socos e chutes
executavam a justiça dos desesperados. Para alguns, ou a maioria, era mais um
ladrão “noiado” pagando o preço de sua
ousadia. Para os braços carrascos só mais umas gotas de suor e sangue
derramados naquele dia comum. Para a mãe, que sabe o pai e os irmãos, a profecia revelada em
noites insones a espera de um retorno. Acabava, logo ali, na minha frente, tão
próximo e tão distante, as esperanças e a vida. A morte o engolia num mergulho
redentor como num encanto. Talvez nos console a frágil certeza de que partiu
desta para uma melhor. O que teria sido mesmo melhor? A cadeia? A clinica de
recuperação ou este abandono que o tempo aplica, como uma severa lei, aos
adictos? Afundado nas águas do desengano ele teve enfim o que merecia. A
solidão dos desaparecimentos, a invisibilidade social e humana que a
dependência imprime em seus adeptos. Que moral ainda me cabe refletir e julgar a falta
de políticas para preservar vidas em
tão indigno desenlace? De longe, vendo o que me é tão próximo e caro, só posso
me envergonhar de ser e ter sido conivente com tal sofrimento. Ao me afastar
disso e distante assistir, me falta aquele passo, o que talvez me aproxime da
coragem de dizer que, como eu, eles não merecem a justiça ignorante dos
ausentes. E possa desligar a TV que me mostra o quão distante estamos da
realidade.
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